Bem- Vindo

Bem- Vindo
Queria tanto ser poeta, falar do mundo, do amor... Porque não da dor? Do sofrimento... Da injustiça então... Enfim, falar do meu sentimento

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Águas do meu rio

A manhã estava sossegada, o céu limpo. 
Aqui e ali via-se uns riscos de nuvens, mas o sol brilhava, aliviando o frio seco da noite.
Decidi tomar a minha porção diária de vitamina D, e sentei-me no banco de pedra na margem da baía.
Dois idosos, no banco ao lado conversavam entre si.
Um de fato e gravata muito gasto. O outro de boné e samarra alentejana.
Dizia o de samarra alentejana, de voz amarga e dorida:A Isabel farmacêutica, disse-me á pouco que já não me pode fiar mais porque já devo trezentos euros.”
O de fato gasto indignado:Mas precisas dos medicamentos para a tensão!”
 - “Pois preciso” - consentia o de samarra alentejana de olhos brilhantes. - “Mas este mês não vou poder tomar, a reforma já se esgotou.”
O idoso de fato gasto fez um silêncio meditativo, esfregava as mãos nervosas e disse metendo a mão ao bolso:Toma cinquenta euros, vais comprar os medicamentos. Não posso aceitar, - dizia o de samarra. - Sei que te vai fazer falta, ainda agora o mês começou...”Toma, - insistiu o de fato gasto. - “eu posso passar um mês sem carne, tu não podes passar um mês sem os medicamentos.”
O de samarra alentejana sabia que era verdade, aceitou balbuciando emocionado algo que não consegui entender.
Vi o homem a afastar-se a ir á farmácia, e vi nos ombros dele, toda a ignorância e toda a indiferença da humanidade.
Voltei a olhar para o rio, e apeteceu-me deixar-me levar pelas águas mansas da baía.

Luís Paulo